O mimo que ele não trouxe

Romero Britto


Professora

Depois de ouvir a lamentação de uma amiga, fiquei pensando se os anos de convívio levam os homens a se esquecerem de certas delicadezas. Ao que parece, todos, na fase da conquista, se preocupam em cuidar dos detalhes e agradar a sua futura ‘presa’. Até os mais toscos conseguem dar um trato na sensibilidade. Flores, ligações constantes, presentinhos. Mas parece que o longo tempo dividindo o mesmo teto, esmaga qualquer possibilidade de gentileza. Melhor, anula qualquer indício de demonstração de afeto. Calma! Não generalizo para não ser injusta com os eternos apaixonados...
Bom, o fato é que essa minha amiga já tem quase 10 anos de casada e espera, ardentemente, que o toque romântico não se perca. (Acho que ela e toda a torcida feminina!). Evidentemente não se espera que o camarada se declare em cem sonetos de amor feito Neruda a sua Matilde. Mas se o cara não sabe lidar com as palavras, pois que seja construtor de ações poéticas materializadas em mimos; gestos. Pois bem, o motivo que me levou a construir esta crônica foi a carinha de decepção que Ela fez depois de receber o maridão que havia ficado longe de casa por cinco dias. O criatura precisou viajar para outro estado por motivo de trabalho. Uma dessas conferências que incrementam a lavagem cerebral. Como qualquer esposa que espera ansiosa o retorno do companheiro, conjecturou que, devido ao período em que ficariam distantes, ele lhe traria no mínimo um mimo ou um suvenir. Que nada! Após tê-lo recebido com um beijo apaixonado, estendeu o braço para acolher uma sacolinha amarela que vinha em sua direção... ‘Êpa, esta embalagem me é muito familiar’. Não, não estava delirando. Era uma lembrancinha que a empresa do moço havia distribuído com os funcionários. Pior, dentro tinha um bolinho com recheio de doce de leite. Poderia ser um deleite se não fosse decepcionante.
‘Não deu tempo, as conferências terminavam por volta das 22hs’.
Ora, sejamos francos. Por que quando alguns homens casam, não sabem mais usar da criatividade? Não haveria uma lojinha de conveniência aberta? Uma farmácia 24hs? Além de aspirinas, se pode encontrar ali outros produtos. Inclusive, chocolates dentro de uma caixinha de papelão bem arrumadinha ou numa latinha enfeitada a um custo muito acessível. Não precisa ser uma coisa valiosa. A depender da mulher com quem se casou, claro! Mas, as sensíveis, ah... essas  se derretem toda diante do menor gesto de amabilidade. Derretem-se! Não pelo mimo trazido, mas, sobretudo, pelas entrelinhas do gesto... Ele simplesmente perdeu a oportunidade de roubar, das suas horas espremidas, tempo para pensar nela e materializar o pensamento num elemento físico qualquer. Qualquer não! Aquele, especificamente pensado para ela. Seria ela, completa, naquele risco de tempo em que ele levaria para comprar-lhe algo.
Seria ela... personificada naquele mimo vindo de longe.

Comentários

  1. “Reina, teu texto será outro manifesto a ser imprimido e distribuído aqui no sudeste!

    Quando homens e mulheres perceberam que o segredo da felicidade dos primeiros tempos era a conquista, e de VERDADE compreenderem que o outro nunca está conquistado definitivamente, e seguirem no ritual por toda vida, ai teremos relacionamentos de darem água na boca tal a alegria que causam.
    Quero brincar de conquistar e ser conquistada por toda a vida. Não abro mão disto.
    ...e sei do que estou falando. Sem isto as brechas surgem e é ai que mora o perigo...
    Viva a Reina! E Viva a solidariedade a sua amiga!”

    Eliana Klas

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  2. Adorei, ótimo texto de hoje...rsrsrsrs...
    Catalice

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  3. Ótimo texto !!!
    muito real....

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  4. Regiana querida! adorei o seu texto. Tô com saudades de vc. Abração. Edileuza Costa.

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  5. Ótimo texto, como muitos outros que já li aqui, parabéns. E realemente é lamentável que esses "mimos" deixem de existir com o tempo... Forte abraço e perdão pelo anônimato, beijão!

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  6. Bom de ler, rápido e possível. Tem a pegada de Gullar e a simplicidade feminina da amélia vanguardista.

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  7. Querida,

    Lembro da nossa comparação com esta historia e da nossa conclusão: um chocolate"zinho" não faz mal a ninguem!
    Parabéns mais uma vez, o texto é rápiso e simples de ler.

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  8. Anônimo

    Perfeito é o que as mulheres necessitam de carinho
    e gentileza por parte de seus namorados e maridos!

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  9. Perdoem-nos belas damas,somos trogloditas sempre aprendendo a difícil arte do amar todos os dias.
    Vocês merecem mimos, gentilezas, agradecimentos por suportarem, por vezes tão devotamente, estes espartanos rudes.

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  10. LINDO!!!!!!!!!!!!!!
    Tem a sua cara e a sensibilidade das grandes mulheres, assim como vc.

    Beijos.

    Sheila

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  11. O texto é bem legal. Mostra um lado da moeda. Espero que, de preferencia, algum homem escreva mostrando o outro lado da moeda.

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  12. Caro amigo anônimo de cima,rsrsrs.
    no texto eu deixei claro que "Não generalizo para não ser injusta com os eternos apaixonados...". Viu! Espero que se sinta motivado (ou motivada, já que não sei o autor da publicação) a mostrar o outro lado oculto... inclusive há espaços para convidados todos os domingos. no aguardo e gracias por ler meu texto. abraços!
    Regiane

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  13. Não consigo ver o outro lado, acho q é por conta de ser mulher e só ter vivido o lado q a Re explorou tão bem. O lado d quem quer ter a certeza de q é amada todos os dias. O amor é uma repetição constante que deve ser reiterada todos os dias. O problema e q mtos se esquecem disto. Mas o texto d Re tá ai para nos lembrar.
    maravilhoso.
    um grande xero
    Prima ASS
    lete

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  14. Preciso sair em defesa dos eternos apaixonados, ok? Mas concordo com você. Do ponto de vista do outro lado, é DECEPCIONANTE não ser lembrado. Horrível mesmo.

    Mas, pelo que eu bem sei, você não passa por isso. Até porque um certo urubuzão parece ser o ótimo marido! ;)

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  15. Qual dos homens escapa desta realidade? Por certo, noventa e nove porcento sofrem deste mal, tendo ao crescimento.Quem sabe, se mais alguém, com essa mesma destreza, bater na mesma tecla,suscite uma redução...

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