HOMEM DE PALHA [Ensaio sobre o palhaço]
“Cultivemos o riso contra as armas que destroem a vida. O Riso que resiste ao ódio, à fome e as injustiças do mundo. Cultivemos o riso. Mas não o riso que discrimine o outro pela sua cor, religião, etnia, gostos e costumes. CULTIVEMOS O RISO PARA CELEBRAR AS NOSSAS DIFERENÇAS.”
Luiz Carlos Vasconcellos
Às vezes há um amigo, ou não, fazendo momices, nem sabe ele que está sendo palhaço. Em certos momentos pessoas atribuem à careta que fazemos a atos de palhaço. Muitos, até, com certa reserva ou criticando lá consigo, pensando que ele mesmo já não foi palhaço um dia, nem que fosse por alguns minutos.
Qual o demérito em ser palhaço? Nenhum. Acho até que somente os iluminados, igualmente aos pensadores mais proeminentes, têm o dom, o biótipo, as características para empreender o magnânimo ofício de palhaço. Este não é um vadio.
Ser palhaço é ter grandeza de alma, é ser bizarro, liberal, nobre e generoso. Em certas ocasiões, por trás daquela pintura extravagante, com um nariz sobreposto também extravagante, se esconde alguém solitário, triste, desiludido da vida, algo que nós traduzimos como estar, aquele ser longânime, chorando, mas fazendo todos nós rirmos.
Palhaço vem do termo italiano omino di paglia que podemos traduzir para “homem de palha”. É, em suma, um artista que nos diverte em espetáculos de circo, ou noutro evento qualquer. Com suas vestes grotescas, gracejos, pilhérias e trejeitos, em certas ocasiões combinados com malabarismos, faz-nos esquecer os problemas por alguns instantes de puro lazer e, talvez, ele mesmo, não consiga desgrudar seus problemas e, assim, rir por fora e chorar por dentro.
Por isso a minha admiração por essa profissão que remonta 5.000 anos, nascida, quem sabe, na China antiga. Daí a minha homenagem mais do que sincera aos palhaços ainda resistindo no mundo inteiro.
E os seus nomes, ou apelidos? Carequinha, Torresmo, Pipoca, Garrafinha, Chuchu, Pimpão, Teco-teco, citar estes, pois a lista é imensa. Quantos desses não estiveram no centro das atenções, nos proporcionando momentos de alegria? Vêm em grandes circos, ou em pequenos. O palhaço geralmente é aquela pessoa humilde que não conseguiu emprego. Passa a viver na rua da amargura, bebendo para esquecer que bebe. Tropeça na própria perna cai e fica com o nariz vermelho. Ao redor da boca exibe a espuma da cerveja, é o branco da boca de palhaço. Sem dinheiro, sua roupa se esfarrapa e os circunstantes lhe dão quaisquer vestes, não lhe caem bem, serve de chacota. E, a partir daí, a sua função é a graça – como engraçado e como gracioso.
Faz mais piadas com a revelação do ridículo que cada um de nós carrega, pois todos têm a capacidade de errar e perder na vida. O palhaço é a essência da representação humana, seja num picadeiro de circo, na penumbra de um palco de teatro ou mesmo na rua, a divertir e ser achincalhado como recompensa por suas palhaçadas. Mas não se esqueça: o olhar do palhaço capta a sua dignidade ou o seu desprezo por sua figura esdrúxula.
Pejorativamente, às vezes, chamam-nos de palhaços como se tal profissão fosse privilégio dos insociáveis e marginalizados. Deturpam o seu significado. É a ignorância fazendo injustiças, agredindo, nas brincadeiras de mau gosto, os deboches demasiados, e, em certos casos, traumáticos, ofendendo a moral: calúnia, difamação, injúria. Quando nos tacham de palhaços, pode ter certeza que é raiva e humilhação.
O Homem de Palha é digno, singelo, merece o respeito e o reconhecimento de cada um de nós. Se o destino o jogou num picadeiro de circo para divertir a todos nós, foi porque o escolheu para ser mensageiro da alegria, proporcionando às crianças, jovens e idosos momentos mágicos de intensa felicidade, mesmo sabendo, que por trás daquela máscara exótica, se esconde um ser humano igual a todos nós, que chora, rir e sofre.
O dia do palhaço é 10 de dezembro.
[AUTOR CONVIDADO] William Lopes Guerra é advogado, pesquisador e escritor em Apodi, herdeiro dos direitos da obra de seu pai, Walter de Brito Guerra.
William, emocionei-me muito com seu texto. Relembrei dos tempos que meu pai me levava ao circo como se fosse um ato sagrado. E o era. Se soubesse que um havia levantado suas lonas, lá íamos nós, em busca daquele universo mágico e único. Mas na verdade, não íamos lá pelas motos dentro do globo, pelos trapezistas ou para ver os animais selvagens serem domados, mas para rirmos com o palhaço. Ele era o nosso centro. Era ele que passava a semana conosco através da alegria que nos contaminava. Era o palhaço que, com sua irreverência, nos mostrava o riso da vida.
ResponderExcluirHoje, os monstros e os bonecos cheios de anomalias representam o riso superficial das nossas crianças... uma pena e uma perda!
Obrigada pela emoção de hj!
Abraços!
Regiane de Paiva
Rir é comungar, prefiro esta definição, melhor do que castigar os costumes...
ResponderExcluirComunguei com suas ideias, teu olhar atento ao humano comove.
parabéns
lete
Prima ASS